Nos meus passeios matinais junto ao mar, obrigatórios para a saúde, aí está ele piscando-me o olho e convidando-me a um repouso. O malvado é teimoso e está sempre a desafiar-me. Também lhe preguei uma partida, fui-me sentar mais à frente, na berma da estrada e em cinco minutos desenhei-lhe o esboço que em casa colori com lápis de cor. O quotidiano registado no meu caderno de esboços.
P.S. Depois lembra-me o sol e o azul e o tempo descomprometido.
Mais um esboço feito em poucos minutos com Futura preta, na pequena vila de Porlezza/Itália, numa única tentativa - tentar apanhar o ambiente local e ficar com a minha fotografia.
O meu insubstituível saco que me acompanha nas eternas andanças Lisboa/Ericeira e vice-versa. No mínimo carrega as minhas preciosidades - o computador, os livros e o material e cadernos de desenho.
Sentada no café Xico fiz este esboço da esquina do Pinta que, no local, colori com lápis de aguarela tendo posteriormente passado uma ligeira aguada. Feito no meu bloco de desenho A6, 170 g. A vantagem deste formato, um pouco pequeno, é andar em qualquer bolso ou carteira e a gramagem permitir-me pequenas aguadas. Tenho de confessar que, desde criança, sou doida por papéis e materiais de escrita mas só gosto deles de grande qualidade. Por exemplo, quase que não uso o pastel pois fui logo comprar duas grandes caixas de Sennelier soft - uma fortuna!!!
Um esboço mal feito e à pressa junto ao arco e à catedral de Fidenza (pequena localidade a 20 km de Parma e bem perto de Salsomaggiore umas termas do princípio do século onde parei 12 dias). O comboio para Parma partia dentro de 10 minutos e eu não queria deixar de ficar com um apontamento.
Tenho fotografias do local e podia ter embelezado o desenho mas prefiro este primarismo com a cor local do que um desenho feito ao rigor dos contornos e das proporções.
Esta aguarela deveria estar na categoria Cadernos de Viagens. Resolvi colocá-la aqui porque não foi feita no local como o são a maioria dos desenhos, aguadas, pasteladas e outros que faço quando em viagem - pequenos esboços terminados no máximo em vinte minutos. Este, pelo contrário, desenhei-o no local e escrevi a lápis muito suavemente as cores que deveriam preencher os espaços; depois, em casa, no pequeno apartamento alugado em Jumièges, bem perto das ruínas da antiga catedral normanda, completei-o e aguarelei-o.
Experiências que, para mim, são as minhas melhores fotografias dos locais que visitei.
E tu existes Sara Andriesd do fundo do quadro me contemplas revelando no teu gesto a saudade que te comprime e nos olhos o pedido do retorno à Holanda ou a Deus que apertas no livro sacro.
Tinha vinte e um anos quando passou por lá a primeira vez. Sabia da existência da Ponte, não lhe sabia o nome mas no Michelin tinha-lhe visto a sombra. Quando se aproximaram, lembrou-se uma vez mais da sua existência. Passaram. Nada viu. Aí despertou em si a certeza de que estas não eram as suas viagens. De que tudo aquilo era um engano. Itinerários. Horários. Obrigações. Não, muito obrigada. Já lhe tinha acontecido na mesma viagem embora diferentemente. Fora no Mont St. Michel. Um dia. E ela deixara os olhos na bruma, na marée, no insólito, no Belo e a alma naquela Merveille onde em todos os recantos descobria o oceano e o infinito. Também falara em deixar cair qualquer outra terra e ficar ali mais tempo. E os itinerários? E os horários? E as obrigações?
Volvidos quase vinte anos voltara. A ponte que ela hoje sabia chamar-se Valentré continuava imperturbável olhando o rio e protegendo a cidade. Para além da ponte descobrira a cidade – de província – sem pretensões por se conhecer bela e segura. A Torre dos Enforcados, onde estranhamente nunca ninguém fora enforcado, disputava as atenções do outro lado do rio. E as ruas e os cafés e a lojinha do material de pintura e o rio e, ali tão perto, St. Cirq Lapopie – a primeira aldeia francesa a ter a denominação de Le plus beau village de France e, ainda aí, outra vez que por lá passara, o conde francês no seu pequeno castelo armado em Museu do Surrealismo; esse homem alto, belo, de uma finura de pintura antiga apesar da sua muita idade e de um cansaço já bastante notório que lhe mostrara, quase à exaustão, os desenhos e pinturas de Picasso, as cores de Picabia, as fotografias de Man-Ray, os poemas de Breton, seus amigos de Paris quando aí tivera uma galeria logo que regressara do Brasil onde vivera longo tempo. Falava português com um ligeiro sotaque pois a mulher, entretanto falecida, era portuguesa. Passara a lua-de-mel em Sintra, conhecia a Ericeira. Tudo isto ela soube quando ele percebeu que ela era portuguesa. Conheceu o seu escritório. Um amplo espaço surrealista num quarto com uma impressionante janela de canto do séc. XVI sobre o Lot e onde por cima da lareira pontificava um quadro de Picasso que lhe era dedicado. A custo, deixou o velho e o seu castelo saído de antanho. Trocou-o pelas grutas de Pech-Merle e por essa espontânea forma primitiva de pintura cuja força se estendeu por todos estes anos.
Voltou. (Re)voltou. Cahors é aquele amor perene que não se explica, sente-se.
Não conheço o João mas conheço alguns dos seus desenhos cheios de cor, de traço largo e certeiro e com muita personalidade. Gosto da sua forma aberta de desenhar e, se continuar a trabalhar, estou convencida que além de bom colorista virá a dominar o desenho. A ele um muito obrigada pelo desenho que hoje aqui está.